Educadora desenvolve projeto para evitar o abandono escolar
• Por Fabiola Rodrigues
O novo ambiente escolar que se configurou durante a pandemia de Covid-19 aumentou a distância entre as pessoas e muitos estudantes vêm sofrendo com essa situação. Pensando nesse cenário, a psicopedagoga Simone Gonçalves desenvolveu um projeto de apoio ao aluno para que ele não abandone os estudos, já que os enfrentamentos emocionais aumentaram muito.
A psicopedagoga atualmente é coordenadora da Escola Estadual João Barbosa Reis, localizada do Setor Madre Germana, em Aparecida de Goiânia, e foi lá que ela desenvolveu o projeto Escuta Ativa, um trabalho que dá suporte emocional para o estudante. A iniciativa está servindo de exemplo para outras escolas em 19 países do mundo e figura entre os 13 melhores projetos escolhidos em nível mundial pelo concurso escolar World Creativity Day.
Simone Gonçalves, juntamente com sua equipe de professores, desenvolveu a Escuta Ativa por acreditar que muitas debilidades – o baixo rendimento escolar, o desejo de parar com os estudos e o déficit de atenção dos alunos – em muitos casos, são provenientes da falta de acompanhamento e de apoio emocional. E é isso que ela vem oferecendo aos estudantes que estão sob a coordenação dela.
Segundo Simone, a disponibilidade para escutar as fragilidades dos estudantes tem sido algo transformador para impedir que o aluno abandone a escola. Ela relata vários casos de alunos da escola que trabalha que já tentaram parar de estudar, mas que, a partir desse momento de escuta, essa realidade tem mudado e os alunos estão permanecendo mais tempo na escola. Segundo a psicopedagoga, muitos alunos que queriam deixar a escola desistiram da ideia.
“Estamos vivendo um momento em que as pessoas não têm paciência para ouvir. Quando nós ouvimos, temos a possibilidade de ajudar a mudar a realidade do aluno, da escola. Com isso, vai-se criando uma corrente do bem”, observa a psicopedagoga.
Os encontros com os alunos acontecem de várias maneiras: no formato on-line, pelo celular, ou até mesmo presencial, desde que seja com horário marcado. Durante a escuta, a psicopedagoga está mais perto do aluno, que divide com ela as experiências que impactam em seu processo de aprendizagem. Ela conta que muitos estudantes relatam agressões verbais, depressão, dificuldade financeira, situações que o desestimulam e reforçam a vontade de evadir da escola.
“Sem ouvir, você não conhece o outro. O aluno só se abre se ele confiar em você, e quando se estabelece essa relação acessiva, e a pessoa percebe que você tem condição de ajudá-la, ela se sente mais confortável para expor os problemas. Nós temos vários alunos que enfrentam várias situações complexas da vida, vícios e violências das mais variadas formas”, diz Simone Gonçalves.
Para a psicopedagoga, antes de advertir o estudante é importante entender porque ele está apresentando algum comportamento diferente ou agressivo. Segundo ela, conhecer a raiz do problema é essencial para amparar a pessoa. “E assim, nós estamos ajudando a diminuir a evasão escolar. A comunidade ganha muito com isso. Tem alunos que vão buscar tarefas e me chamam para conversar, dividir suas angústias. A escola está fechada, mas o ambiente escolar está aberto para ouvir”, complementa Simone.
Nem todo aluno tem iniciativa de buscar essa ajuda. De acordo com a psicopedagoga, alguns precisam ser motivados a buscar mudança comportamental, todavia, ela esclarece que ninguém consegue ajudar o outro se ele não estiver minimamente disposto. “Além do conhecimento científico, a pessoa leva consigo toda uma bagagem e experiência de vida e emocional. Em muitos casos, os estudantes não se desenvolvem justamente por não resolver questões emocionais. Se a parte psicológica estiver afetada, dificilmente o aluno vai apresentar bons resultados”, enfatiza a psicopedagoga.
“Se praticamos a escuta ativa, evitamos muitos problemas”
Paulo Victor, que também faz parte do projeto Escuta Ativa e dá aulas na Escola Estadual João Barbosa Reis, é um dos professores que compõem o projeto. Na opinião dele, a experiência está sendo transformadora para a escola. “Nesta pandemia, muitos estudantes estão procurando por diálogo porque estão carentes. Quando começamos a ouvir, a gente descobre que tem aluno que se mutila, se corta, se agride. Isso a gente descobre somente conversando, não tem outro caminho. Se praticamos a escuta ativa, evitamos muitos problemas”, diz Paulo Victor.
O professor relata que existem casos em que o aluno deseja apenas desabafar, chorar para que tudo fique bem. “Vamos fazendo um trabalho de formiguinha. Quando ele fala, se expõe e a gente entende. O ato de ouvir é mágico”, observa o professor.
A estudante Sandra Santana, 39 anos, que estuda no segundo ano do Ensino Médio, conta que iria abandonar os estudos porque estava passando por problemas pessoais, mas se sentiu acolhida ao ser direcionada para a equipe da Escuta Ativa.
“No ano passado, eu já estava tendo dificuldade para aprender e, neste ano, achei mais difícil continuar. Mas nas reuniões on-line com a Simone e o Paulo Victor eles me incentivam a não desistir. Falo das minhas dificuldades, daquilo que passo em casa e, por meio de muito apoio, estou seguindo os estudos. Sem isso, eu já tinha deixado a escola e não estaria estudando”, relata a estudante.
Sandra Santana é mãe de dois filhos e tem problemas de memória. Para ela, enfrentar a escola era uma barreira, dificuldade que aumentou com as aulas em formato on-line. Ela não desistiu devido ao incentivo do Escuta Ativa.
O estudante Jhonatan Reis, de 20 anos, conta que, sem abertura para contar algumas situações pessoais, queria desistir, porém encontrou apoio e verdadeiros amigos ao ser direcionado para o projeto Escuta Ativa na escola. “Recebo incentivo. Contei coisas que nem eu mesmo achei que falaria, fui ouvido e essa sensação de falar com segurança alivia e deixa a mente mais tranquila para focar nos estudos. Percebi que melhorei bastante”, diz Jhonatan Reis.